No domingo 27 de outubro Lou Reed foi embora para sempre. De manhã entrei no Facebook e quase todos os meus “amigos” o lembravam. No mesmo dia também faleceu o filósofo e crítico de arte Arthur Danto.
Estes meses em São Paulo tenho conhecido uma pessoa que faz uma pesquisa sobre o artista Carybé, argentino de nascimento, mas residente no Salvador de Baia quase a vida toda.
Na semana passada, falando sobre a situação da arte contemporânea no Brasil, ele apontou à ausência total de regras, uma radical tolerância e um profundo pluralismo, diz-se, as disciplinas têm perdida sua autonomia. A verdade é que não vejo problema nenhum nisso. Eu senti a necessidade de desempoar o crítico Danto, o qual desenvolveu as razões históricas pelas quais a arte já não pode sustentar nenhum tipo de relato.
Segundo ele, o modernismo introduz um elemento que marca um ponto na história da arte: a autoconsciência. Aí as condições de representação vêm a se tornar centrais. A arte vai se perguntar pelo meio específico da pintura ou da escultura, isto é, pergunta pelos métodos característicos de uma disciplina para uma autocrítica, mas não para subvertê-la quanto para reafirmar sua área específica.
Por outro lado, o meu interlocutor falou que o uso dos conceitos pode levar à confusão. A modernidade não só faz referência a um período, cujo início é no final do século XIX, mas implica mudanças marcantes num novo nível de consciência. Mesmo assim, o conceito “moderno” não significa aquilo mais recente, mas dá conta como uma noção de estratégia, estilo e ação.
Parece que foi a partir de 1960 quando a arte tinha perdido o rumo. Já não existia uma corrente, mas uma grande variedade: minimalismo, neo-realismo francês, pop, op, abstração geométrica, nova escultura, happening e arte da performance, etc… Portanto, se a arte fica longe de atingir uma única direção histórica, será que podermos afirmar que a arte contemporânea se caracteriza pela perda de direção, pelo caos (produção massiva desarrumada) e pela quase total liberdade?
Segundo Danto, uma vez que a Brillo Box de Andy Warhol foi apresentada na galeria Stable (em NYC), o significado da arte já no pode ser atingido através dos exemplos concretos, mesmo porque as aparências não dão conta. Portanto, a arte precisou dar um giro para a filosofia. Achei que o meu interlocutor não consegue concordar. Ele ama a pintura barroca e não sente se mexido nem pelas Brillo Box nem pelos ready-mades em geral.
A partir daqui, a pergunta fica clara: o que acontece com a arte em si mesma? O que acontece com a obra da arte em relação à filosofia? Danto demarca três momentos na história da arte: o primeiro é a era da mimese, o segundo, a era dos manifestos – quando o modernismo introduziu a filosofia no coração da produção artística, e o terceiro, o que ele chama a era pós-histórica.
O fim da autoconsciência leva uma liberação dos artistas da carrega histórica. A partir daí os artistas podem fazer tudo aquilo que eles desejam. Com a chegada da contemporaneidade, nenhuma arte é mais verdadeira do que outra, nem são confrontadas historicamente.
O que Danto chamou a era dos manifestos é filosoficamente indefensável, porque todo manifesto singulariza a arte que justifica como única e verdadeira. Na arte contemporânea, aliás, uma Arte Verdadeira não existe, mas toda arte é igual e indiferentemente arte. Assim acontece uma anulação de toda hierarquia possível.
Então, qual é a diferença entre uma obra de arte e alguma coisa que não é uma obra de arte quando não podemos perceber diferenças entre elas? Para Danto é um problema filosófico explicar as diferenças entre uma Brillo box exposta na galeria Stable ou num supermercado, ou entre a música e o barulho ou entre a dança e o movimento.
Assim podermos afirmar que “o contemporâneo” não exclui, mas captura ou acolhe as disciplinas todas considerando-as iguais. Isto não significa que não exista uma direção histórica, mas uma pluralidade de direções. Vou torcer ao meu interlocutor para responder neste meio à questão da autonomia das disciplinas.
Será após do fim de Danto que vai começar a era pós-disciplinar?